sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Selvageria

Ninguém escolhe ser "preto", pobre, assaltante e estar marginalizado em uma sociedade que te encara com maus olhos independentemente de você cometer ou não qualquer delito, de fato.

E "preto", pobre e bandido também tem televisão em casa e também está exposto a uma mídia que vende a riqueza e a ostentação como meios para encontrar um sentido de felicidade na vida, validando a si próprio através de grana, marca e glamour. 

Daí playboy filhinho de papai quer dar porrada porque o menino roubou um tênis Nike da última geração e o cacete a quatro, que esse "preto" NUNCA terá grana pra comprar e considera JUSTO, pois se viu impotente frente à ação delituosa que o infligiu. E, em última instância, revolta-se contra o Governinho cretino que não logra êxito na política de segurança pública. Ora, cuida-se da legítima defesa coletiva de um sociedade sem Estado, segundo a notória justiceira Rachel Sherazade, Anita Garibaldi dos tempos modernos.

De tal arte, em nome dessa revolta pessoal - quase uma crise existencial, cumpre ressaltar - sente-se o cidadão de bem no direito de fazer a justiça tal como supõe justa, isto é, com seus próprios meios.

Pitboys à vista, teje preso! E dá-lhe pancadaria; mas essa pode, é claro.

Não obstante, justos que somos, vislumbramos a situação como um todo, atentando-se às peculiaridades do outro lado da moeda, evidentemente. Ah, não? Não. Porque bandido bom é bandido morto. Higienizemos a sociedade de tais vermes, afinal.

Todavia, faz-se mister relembrar de alguns pequenos detalhes: "Preto", pobre e bandido também têm família em casa e contas pra pagar; também adoece e precisa se internar; também tem sonhos e sofre quando a realidade rouba-lhes oportunidades de concretizá-los com dignidade. Vou contar-lhes um segredo, mas que fique só entre nós, pode ser? Lá vai:

"Preto", pobre e bandido também é gente.

E a sensação de impotência que os "favelados bandidos" tem frente a essa sociedade tacanha e mesquinha em que vivemos? Com efeito, esta existe e não é porrada/linchamento/desprezo que irá resolver, assim, feito passe de mágica, com nobres nocautes e chibatadas ao vento.

O problema é cultural, político e humanitário. Somos seres pensantes, racionais e temos plena e incontroversa capacidade de alterar a rota desse destino infiel e desgraçado a que nos encontramos expostos, sejamos criminosos ou não.

Que a gente não se reduza à barbárie dos animais. Que a gente não encare o semelhante como lixo. Que a gente tenha mais luz, mais amor e força pra lutar contra o verdadeiro inimigo: a oportunista IGNORÂNCIA.